segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

O Trabalho com a Leitura

 "A leitura deve ter por fim dar ao espírito uma direção que lhe permita proferir juízos sólidos e verdadeiros sobre tudo o que se lhe apresente". ( Descartes)

O TRABALHO COM A LEITURA
A perspectiva deste trabalho parte de dois pressupostos:  um que se refere à leitura como uma prática social e suas relações com o ensinar e aprender na escola e o outro diz respeito ao papel  da leitura na formação do aluno. Uma prática de leitura intencional, cotidiana, vivenciada por alunos e professores, alicerça-se numa concepção de que ler é inserir-se numa comunidade de leitores, mas para isso é necessário tanto decodificar – pois decifrar o escrito é poder ler com autonomia – quanto identificar,  interpretar e construir significados.
Assim, esta proposta de trabalho está centrada em dois movimentos simultâneos e independentes: o primeiro se relaciona ao para quê e como ler e o segundo, ao que ler.
Quanto ao “para que e como ler”, é importante instituir, na escola, um clima de leitura com todos os componentes curriculares que considere a necessidade de haver procedimentos em função do objetivo que se tem em determinados momentos do trabalho pedagógico:
- ler para encontrar uma determinada informação;
- ler para memorizar algo;
- ler para ter “ modelos textuais”;
- ler para posicionar-se;
- ler para escrever.
Assim, é desejável construir uma prática de leitura compartilhada em que o professor, oriente o processo de leitura do aluno, aprofundando os fundamentos de sua área curricular.
Quanto  ao “o que ler”, é fundamental haver uma relação de textos que garanta tanto a multiplicidade textual quanto a qualidade do material, ainda que saibamos que ter um acervo bom e diversificado é indispensável, mas não suficiente para modificar a situação de não – leitor de grande parte dos alunos.
As atividades programadas devem ter os seguintes objetivos:
- contribuir para a proposta pedagógica da escola;
-fazer da leitura o princípio articulador do trabalho pedagógico;
-relacionar os componentes curriculares a um trabalho multidisciplinar.
O foco principal do trabalho é (re) construir a história de leitor do aluno, através do uso de livros ficcionais e não ficcionais, em articulação com outros materiais de leitura ou materiais pedagógicos. Os princípios que devem reger as atividades programadas entendem que a linguagem é multidisciplinar por natureza, por isto, a escola se constitui em uma comunidade de leitores e todo professor é professor de leitura e escrita. As propostas de trabalho com os livros partem de uma concepção ampliada de leitura, em direção a uma prática orientada e compartilhada em que o professor como leitor/mediador e ciente de que ler é uma atividade “invisível”, com poucas manifestações exteriores, leve em conta as:

- estratégias cognitivas: através das quais, o leitor realiza operações automatizadas, inconscientes e que se baseiam no seu conhecimento lingüístico, ou seja, o leitor apóia-se no que conhece da língua em que o texto está escrito; na gramática interna que todo usuário da língua possui, independentemente da escolarização ou grau de letramento; no vocabulário ou reconhecimento instantâneo das palavras do texto. Estas operações possibilitam assim a decodificação das palavras e também o reconhecimento gráfico do texto, ainda que o leitor não consiga descrever como ele faz isso. ( KLEIMAN,Angela. Oficina de leitura.Campinas: Pontes,1993, p.50).
-estratégias metacognitivas: sujeitas ao nosso controle consciente, através das quais somos capazes de dizer e explicar nossa ação no ato de ler. ( KLEIMAN,Angela.Oficina de leitura.Campinas: Pontes,1993, p.50).

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Desenvolvimento das Estratégias de Leitura

O professor deve possibilitar o desenvolvimento de estratégias de leitura para que o aluno possa, aos pouco, tornar as operações cognitivas e metacognitivas conscientes. São elas:
A- Hipóteses e Antecipações:  o professor propicia a elaboração de hipóteses e antecipações a partir do levantamento dos conhecimentos prévios do leitor sobre o mundo e a linguagem: o assunto, o portador de texto, o autor, as estruturas textuais (gênero), a intencionalidade e a finalidade do texto. Para isso, pode-se ler o texto com os alunos e não para eles, monitorando o processo de leitura num verdadeiro exercício de “modelar estratégias”,levantando questões, tais como:
- “ A partir do título do que será que vai tratar este texto?” “ Onde está escrito este texto?” Sabemos que, pelo título, explica-se o tema e pelo portador de texto fazemos a relação entre texto e contexto.
- “Quem é o autor? ”  “Sobre o que ele escreve?” “O que você já leu dele?” É a relação entre o texto e o contexto mais o levantamento do repertório textual do leitor que entram para a leitura também.
-“Quem conhece este tipo de texto?” “Como ele é graficamente?” Hoje estão disponíveis pesquisas recentes que mostram que desde cedo as crianças já reconhecem as diferenças textuais e gráficas/diagramação, ainda que não leiam, decifrando palavras.
- “Para que será que este texto foi escrito?” Saber a finalidade do texto contribui para sua compreensão, por exemplo, o texto publicitário tem a finalidade primordial de vender algo ou alguma idéia, daí seus “atrativos” visuais e/ou sonoros, para realçar as qualidades do produto veiculado.
B- Construção de unidades de significação: a leitura deve ser entendida como busca de unidades de significação mais amplas ou o estabelecimento de uma rede de relações entre as proposições do texto. Inclui-se, nesta estratégia de leitura, as questões de coerência textual e progressão temática: O tema iniciado no texto é mantido ao longo do texto? Há relações entre as estruturas mais amplas do texto, para além das unidades de significado/vocabulário?
C- Seleção de índices importantes para a compreensão:
Fazer predições, antecipar, formular hipóteses para selecionar as palavras ou idéias chave. Inclui-se aqui os elementos coesivos que auxiliam o leitor a localizar um verdadeiro “roteiro” das relações estabelecidas pela coesão do texto. Aos poucos, o professor e o aluno elaboram um verdadeiro “mapa” do texto que está sendo lido.
D- Inferência: A partir de algumas pistas dadas, num verdadeiro “jogo de adivinhação”, deve-se buscar os significados, lendo o que está escrito no texto. Um bom exemplo de inferência é quando lemos uma piada, pois rimos exatamente porque entendemos o que não está dito explicitamente – piada explicada não tem graça. Um outro  exemplo de inferência é relativo ao léxico, através do qual estabelecemos significados aproximados de palavras usadas que desconhecemos, mas podemos “adivinhar” seus significados pelo contexto do próprio texto e, num segundo momento, consultar o dicionário para reforçar ou negar essa inferência, quando um significado mais exato se mostrar essencial à compreensão.
E- Avaliação,Verificação e Reformulação: durante todo o processo de ler, vamos realizando críticas totais ou parciais, reconstruindo o texto lido inclusive, parafraseando-o, ou seja,redizendo-o com nossas palavras.
F- Construção do Sentido: é o momento de articular todas as reflexões feitas sobre o texto, incluindo a intencionalidade do autor, o reconhecimento das estruturas textuais e do portador de texto.Saliente-se que o processo de leitura não segue uma ordem rígida e linear, em que cada passo depende do anterior, mas é um movimento simultâneo de relações. Daí a ênfase no professor como realizador das interferências junto aos alunos, num verdadeiro trabalho de “ensinar a ler”, de “ter aula de leitura”. O processo é elíptico, como estabelecimento de conexões entre os vários componentes do texto e o leitor. Assim, é fundamental que o professor tenha claro as habilidades de leitura como norteadoras do seu trabalho de formar leitores.
Habilidades de leitura
- localizar informações explícitas em um texto;
- estabelecer relações entre partes de um texto, identificando repetições ou substituições que contribuem para a continuidade de um texto;
- inferir o sentido de uma palavra ou expressão;
-inferir uma informação implícita em um texto;
- desenvolver interpretação, integrando o texto e o material gráfico;
- identificar o tema de um texto;
-identificar a tese de um texto;
-estabelecer relações entre a tese e os argumentos oferecidos para sustentá-la;
-diferenciar as partes principais das secundárias de um texto;
-identificar o conflito gerador do enredo e os elementos que constroem a narrativa;
-estabelecera relação causa-consequência entre as partes e elementos de um texto;
-identificar a finalidade de textos de diferentes gêneros;
-distinguir um fato da opinião relativa a esse fato;
-estabelecer relações lógico-discursivas presentes, marcadas por conjunções, advérbios, etc;
- perceber efeitos de ironia ou humor em textos variados;
-reconhecer o efeito de sentido decorrente da escolha de uma determinada palavra ou expressão;
-reconhecer o efeito de sentido decorrente da exploração de recursos ortográficos ou morfossintáticos.
Desta forma, o professor estará sempre presente no processo de leitura do aluno, caracterizando-se em algumas circunstâncias como uma “presença física” que determina para quê, o quê,quando e como se lê, através da orientação da leitura dos alunos. Poderá realizar atividades permanentes e projetos específicos de leitura, por gênero, por temas, por autores, atividades que auxiliam a ampliação do repertório textual  dos alunos. Em outros momentos, sendo uma “presença ausente”, ao selecionar o acervo e elaborar um trabalho de leitura de longo prazo, ao propiciar leitura livre do aluno e ao intercambiar estas leituras feitas.


                                          A escola como Comunidade de Leitores e Produtores de Texto

Deve ser preocupação da escola criar uma clima propício, explicitando diferentes objetivos de leitura/escrita e diferentes modos de ler/escrever. Para isto, é possível organizar modalidades pedagógicas de trabalho como:
- Projetos: além de oferecer contextos nos quais a leitura ganha sentido e aparece como uma atividade complexa cujos diversos aspectos se articulam em função da conquista de um objetivo, permitem uma organização muito flexível do tempo: dependendo do objetivo que se queira alcançar, um projeto pode ocupar somente uns dias ou desenvolver-se ao longo de vários meses.
- Sequências de atividades:  que permitem ler com os alunos diferentes exemplos de um mesmo gênero ou subgênero ( poemas, contos de aventuras, contos fantásticos); diferentes obras de um mesmo autor ou diferentes textos sobre o mesmo tema. Diferentemente dos projetos que se organizam em torno de um produto tangível, as sequências de atividades incluem situações de leitura em que ler é o único propósito explícito e compartilhado com os alunos.

O Professor como Leitor Proficiente e Modelo

O professor como leitor e modelo para o aluno está em constituição permanente, porque sua formação é um processo inacabado, dada a natureza do seu trabalho: socializar conhecimentos acumulados e contribuir para produzir outros conhecimentos. O professor é ainda mediador de leitura, porque escolhe as estratégias de abordagem e explicita as habilidades com as quais trabalha, na direção da formação do aluno. Por fim, o professor é um dos articuladores na relação componente curricular/leitura, pois é ele um dos vértices do “clima de leitura” na escola.

O Aluno como Leitor e Produtor de Texto

O trabalha com a leitura entende que o texto é multidisciplinar, por isto a formação do aluno como leitor e produtor de texto é tarefa da escola, dos vários componentes curriculares e não de um componente específico. Por exemplo: para que todo professor seja um professor de leitura, ao trabalhar um texto deve explicitar as relações entre a textualidade – tema e progressão temática, coesão, coerência, informatividade, intertextualidade – e os conceitos
 Próprios do seu componente. Assim, não se perde a especificidade de cada área do conhecimento, ao mesmo tempo que relaciona às intenções e formas de dizê-la em textos.
( Textos em Contextos: Formando Leitores – vol.I – pág.16 - SEE/CENP)

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